quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

O conservadorismo e a retórica

A avaliar pelas notícias que circulam, o PSD vai decretar hoje o fim do seu cúmplice namoro com sua excelência o senhor representante da República para a Madeira. Nada mais oportuno. Com as eleições ao alcance da vista, é preciso reacender a eterna querela autonómica. E como o dito representante aceita oferecer-se como bandeira, qual cordeiro pascal à espera de degola, lá teremos esta noite a comissão política laranja a declarar o fim das núpcias.
Jardim não costuma brincar em serviço. Para ele, os entendimentos pessoais têm sempre uma dimensão estritamente política. Ao contrário de todos os mortais, o dr. Jardim não consegue ter afectos genuínos ou relações pessoais normais. A crueza da vida só lhe deixa ter conveniências. O que quer dizer que o embevecido invólucro pessoal de salamaleques saltitando da Quinta Vigia para São Lourenço, e do Palácio para a Quinta, está em vias de ser mandado às urtigas pelas ingratas exigências da política pura e dura. Porém, acreditem. Em boa verdade, a alma sensível do dr. Jardim sofre com o facto. Mas a política, meus senhores, quantas exigências faz, quantas cambalhotas exige, quanta acrimónia encenada ou fingida reclama...!
É claro que ao escolher cirurgicamente os períodos pré-eleitorais para os pretensos amuos com o senhor representante, o dr. Jardim corre riscos. Desde logo, o de confundir as pessoas. Tão depressa anda de enlevado e cavalheiro namoro com o ministro cooperante, como logo a seguir desata a fazer juras de eterna ruptura com o representante convenientemente tresmalhado. Tão depressa o apresenta como amigo da terra, como, não tarda nada, há-de começar a apontá-lo como símbolo perverso do poder colonial que teima em estrangular-nos.
Mas, o pior nem é isso. O risco maior que o dr. Jardim corre nesta montanha russa de estados de alma relativamente ao palácio de São Lourenço é de outra ordem e remete-nos para o total esgotamento do seu discurso autonómico. A verdade é que esse discurso tem vindo a perder fôlego. Não por falta de convicção, concedo. Mas por manifesta falta de ideias e de causas. Tendo chegado ao pindérico ponto em que tudo se resume a umas enfáticas diatribes contra o primeiro-ministro e, a partir de logo à noite, a um apontar de dedo ao representante que, no fim de contas, sempre protegeu e lhe deu jeito. Ora é aqui que reside o risco. Um dia, toda a gente há-de perceber que a Autonomia que nos trouxe o desenvolvimento merecido já não passa, para o dr. Jardim, de uma mal preparada e por vezes malcriada retórica de mera conveniência eleitoral.
Continuo a acreditar, com muitas outras pessoas, que é possível reinventar permanentemente a Autonomia. Não apenas na sua dimensão puramente institucional, mas na prática governativa de todos os dias. Tanto na ordem regional interna, como no domínio das nossas relações com outras realidades geográficas, políticas e económicas mais ou menos contíguas. Acredito, em suma, que, em matéria autonómica, está sempre tudo por fazer. O problema é que o conservadorismo do dr. Jardim e da corte notável dos seus próximos entende que a coisa se resume à luta pela manutenção do seu cada vez mais inchado poder. Aproveitando as posições entretanto conquistadas. E beneficiando da deserção das alternativas credíveis. E um dia o futuro há-de passar-nos a factura.
Bernardino da Purificação

Um comentário:

Anônimo disse...

O senhorito,testa de ferro, da FAMA(terrorista e encapotada ex-FLAMA) deu o mote,estendendo a passadeira azul-amarela,para o Grande Chefe vir ao encontro das "justas aspirações atonómicas" da gamada Raça Superior!
Coerência não lhes falta...