sábado, 27 de junho de 2009

Os aventais da política doméstica

O dr. Jardim adora as histórias de aventura e mistério. A Trilateral povoa-lhe os sonhos. Com a Maçonaria tem uma relação de amor-ódio. E o clube de notáveis que alegadamente aspira governar o planeta e respectivos arredores exerce sobre ele fascínio idêntico ao da luz que se esconde por detrás das trevas. Reminiscências, presumo. Dos seus verdes anos de operacional de secretária. Ou, melhor dito, herança dos tempos em que, fujão, trocou a carreira de tiro que defendia para os outros pelas manobras arriscadas da acção psicológica. Acreditem. É de tal modo intensa a sua queda para o oculto que é nela que nascem e desaguam muitas das decisões políticas que toma. E assim não precisa de prestar contas a ninguém.
Querem um exemplo? Pois cá vai.
Era uma vez um presidente de Câmara acidental caído de pára-quedas na função. Para sua eterna desgraça, o acaso que lhe indicou o caminho da política omitiu-lhe que teria de partilhar os Paços do concelho com os olhos e ouvidos de quem tudo pode. Um safado, como veremos, o dito acaso! Acresce que, ingenuamente alheado de tão ameaçadora circunstância, o fortuito presidente atribuiu-se, ainda por cima, o direito de achar que poderia nomear para chefe do seu gabinete alguém da sua confiança pessoal. De modos que um dia, sem olhar a sério para o terreno minado que pisava, resolveu sacar um nome do seu rol de relações. E talvez porque cumprisse um destino trágico, decidiu fazer seu lugar-tenente o motivo futuro (só mais tarde viria a sabê-lo) da sua presente desgraça.
Importa salientar que olhos e ouvidos de quem tudo pode não passa de um modo eufemístico de dizer outra coisa. Em bom rigor, há bastante mais anatomia envolvida no caso. Porém, percebam. Não gosto de imiscuir-me nas histórias cor-de-rosa de ninguém. Até porque sei, de ciência certa, que as conhecidas razões que Pascal desconhecia conservam ainda, nos dias de hoje, a razoabilidade que as celebrizaram. É-me impossível, no entanto, deixar de convocar aqui tão delicada e pessoal matéria. Por uma razão simples, que passo a exprimir com a máxima elegância que a inspiração me dá: é público e notório que uma componente importante da política regional passa pelo leito clandestino dos serôdios arrufos presidenciais.
Importa, do mesmo modo, avançar algumas notas da biografia não pública do cavalheiro que o nosso improvável edil entendeu nomear seu acólito. Garante quem sabe (e a Quinta Vigia tem a certeza que sabe) que o cavalheiro em questão é dado ao esoterismo de certas práticas discretas. Usa avental, em suma. Obviamente fora das suas actividades profanas. E evidentemente à margem das suas obrigações profissionais. Mas, como se sabe, na Madeira é assim. Um maçon é, por definição, um suspeito. E se, ainda por cima, se dá ao desplante de se travar de razões com a mais-que-tudo da única pessoa importante da ilha, de suspeito passa de imediato à condição de condenado.
Ora, para desgraça do futuro ex-autarca vicentino, foi exactamente assim que as coisas se passaram. O seu chefe de gabinete desentendeu-se com a notária da Câmara. Esta bateu com a porta e foi a correr chorar no ombro amante do nosso capo di tutti capi. E este, furibundo e de coração dilacerado, accionou de imediato os mecanismos de punição. Num primeiro momento, mandou despedir o aventalado chefe de gabinete, a pretexto da sua putativa condição de maçon. No seguinte, despachou o ingénuo presidente da Câmara, por não ter percebido que, na Madeira, há uma política de travesseiro que se sobrepõe à política institucional. E assim foi feita justiça. E assim se vai escrevendo a política.
Há, no entanto, algo que não consegui perceber ainda. O que é que terá sido tratado, no mês de Março passado, no cordial (fraterno?) e secreto encontro que Jardim manteve na Quinta Vigia com o Grão-Mestre da Maçonaria Regular portuguesa? Alguém poderá elucidar-me? Ou será este mais um dos mistérios que tanto animam o ócio do presidente?
Bernardino da Purificação

segunda-feira, 22 de junho de 2009

A inevitabilidade do regresso

Regresso. Estimulado pelo doce contentamento que se tem quando se volta. Estarrecido, porém, com os estados de alma que surpreendi em boa parte dos comentários que li. Abreviando, a coisa mais parece uma montanha-russa. Com píncaros de incenso que de todo não mereço. Entremeados por chibatadas depressivas na alarve retoiça de um pelourinho que não esperava. Um retrato, em suma, da vidinha que levamos. Que me faz lamentar não ter percebido antes que fazer um blogue é o mesmo que aceitar o jugo de um contrato leonino (logo eu, que não escondo a minha militante condição de lampião empedernido..!) que só me traz obrigações. E que me leva a suspeitar que há por aí muita intolerância escondida por debaixo de um estaladiço (valha-nos isso!!!!) verniz democrático.
Se bem entendi, há quem tenha passado a exigir de mim a aceitação do ritual diário da escrita e o cumprimento de uma agenda política qualquer. Como se me fosse negado o direito de escrever o que simplesmente me apetece. Ou como se alguns dos meus estimados seguidores reivindicassem para si o direito de me expropriarem de um espaço que eu próprio aceitei voluntariamente partilhar. Ignoro, como é evidente, onde é que esta gente vai legitimar semelhante conduta. Temo, no entanto, que os catecismos onde se inspiram possam ser versões usadas das cartilhas que dizem condenar.
Não é meu propósito tornar demasiado pesado o fim deste interregno. Até porque ainda respiro os fumos da Makumba (assim mesmo, com kapa e maiúscula, numa para mim deliciosa private joke) que me levou ao retiro. Porém, não posso deixar de afirmar que ando farto dos penduras que aqui se instalaram de armas, rancores, bagagens e ressaibos. Cabem cá todos, como é evidente. E aqui ninguém é superior a ninguém. Mas já que falamos de estados de alma, concedam-me o direito de expressar também o meu.
Em suma, meus ilustres amigos, regresso para tentar ser o que sempre fui: um observador independente da política madeirense; um comentador de políticas e de condutas políticas; um homem livre que não cede a chantagens nem abdica do seu exercício diário de liberdade. Quando escreve e quando não escreve. E quem pensa que algum dia eu possa cair na tentação de ceder aos bruderes ou a outros cavalheiros quejandos bem pode esperar sentado. De preferência, sem chatear.
Agradecido.
Bernardino da Purificação