E pronto. Como quase sempre o mérito compensa, o mundo da bola lá se rendeu aos feitos desportivo-contabilísticos do "nosso" Cristiano Ronaldo. A distinção, reconheça-se, é mais do que justa. Porque ninguém jogou tão bem como ele na época que passou. Em golos. Em habilidade técnica. Em capacidade atlética. Em espectáculo puro. E também ninguém como ele pôs a girar a roda dos milhões de que se alimenta a não sei quantas vezes milionária indústria futeboleira.
Acontece, de facto, que Ronaldo é hoje uma das marcas mais impressivas e rentáveis do negócio global que é o futebol. Vende como ninguém. Em merchandising. Em páginas de jornais. Em capas de revista. Em gadgets diversos. E o negócio, claro, está-lhe grato.
A bem dizer, este Ronaldo já nem é propriamente "nosso". É deles. Ele já descolou há muito da sua condição original de simples madeirense jogador de futebol. Como os negócios planetários se alimentam de vedetas planetárias, foi dada a Cristiano Ronaldo a condição de ícone que a indústria faz render e a publicidade amplifica. Para glória do desporto-rei. E para enormíssimo proveito da máquina por trás da qual se encontra um exército de personalidades sem rosto, sem afectos, sem emoções. Estes, os afectos e as emoções, ficam por nossa conta, por conta dos espectadores. Que todos os dias discutem, discutimos, a bola que estoura na barra. Que diariamente se perdem, nos perdemos, em horas de conversa sobre o fora-de-jogo que não era, sobre as apitadelas suspeitas da equipa de arbitragem, sobre a entrada arrepiante do facínora do defesa da equipa adversária.
Não quero enfatizar, podem crer, o lado cínico e assumidamente contabilístico que todos sabemos existir no mundo da bola. Não é o momento próprio. Aliás, mesmo que o quisesse, bastava lembrar-me de cada um dos momentos de puro virtuosismo com que Ronaldo nos brindou na época passada para logo decidir arrepiar caminho. Ainda assim, manda a lucidez que me esforce por perceber que até com o merecimento de um prémio se joga muitas vezes no tabuleiro em que jogam os gestores do futebol-business. É raro haver batota na escolha? Acredito piamente que sim. Mas isso não é virtude. É apenas condição de sucesso. Uma actividade que vive de paixões acaba por ficar refém delas.
Não pretendo, de igual modo, entrar na demagogia barata de colocar frente-a-frente o futebol-glamour de que hoje se fala e o seu parente pobre feito de jogadores com ordenados em atraso e construído de coisas obscuras e traficâncias várias. Isso seria, convenhamos, uma nota de mau gosto. Que Ronaldo não merece. E que o nosso orgulho insular certamente reprovaria. Fico-me, pois, pelo registo de um prémio de amplificação planetária que um meu conterrâneo mereceu e ganhou. Sem, no entanto, poder deixar de pensar o que seria deste Ronaldo, ou de um outro qualquer que por aí ande, se tivesse optado por ficar cá na terra. O mais certo é que nunca passasse de uma terceira ou quarta escolha atrás de um daqueles futeboleiros do Brasil que por cá vão desembarcando às carradas para sorte deles e lucro de uns quantos.
Bernardino da Purificação
3 comentários:
Pois é...
Isto é cíclico.
Os três Fs estão aí.
Cada época,tem os seus inúteis "bezerros de ouro",adorados no grande circo alienador da populaça.
E,então,se houver fogo de artifício,espetada e vinho seco,tanto melhor!
Isto digo eu, que sou o que sou.
Pois é se o "Madeirense" Ronaldo, não tivesse,cedo, bem cedo, emigrado para o reconhecido rectangulo, seguramente que hoje continuaria a ser o "Madeirense" Ronaldo, filho do Sr. Aveiro e possivelmente craque do andorinha ?
Poré, ai daquele que hoje não se lembre de identificar o jogador Ronaldo como madeirense.
Enfim limitações comportamentais, como há bem pouco falou um tal de Representante.
Pois é...
Até o senhor do Poço, digo,Fonte de Boliqueime rende homenagem ao craque da bola!
Não é PC(politicamente correcto)dizer-se que o rapaz, para além do domínio do esférico, não é um exemplo de educação (que os repentinos milhões não conseguem comprar). Como diz uma Senhora, Mulher de um Amigo meu,"Chá" é coisa que se toma na altura própria; fora de época,tem sempre um sabor requentado.
Tanto na Madeira como no Algarve.
Mas, como o que verdadeiramente importa é o Ter e não o Ser:
Viva o Vinho Seco, viva o Bolo-Rei!
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