domingo, 10 de agosto de 2008

Parcerias público-privadas

Uma vez que tenho família, compreendo e presumo que o cidadão Alberto João Jardim não tenha gostado de saber que um dos seus genros é arguido no processo de averiguações que envolve o Clube Sport Marítimo. E porque acredito que ele seja uma pessoa normal, daquelas para quem a família é intocável, confesso que sinto alguma dificuldade em trazer o assunto à baila. Acontece, porém, que o cidadão Jardim é também o presidente do governo regional. E ocorre igualmente que o dito cidadão-presidente cometeu a imprudência de expor a família ao escrutínio político e à voragem da curiosidade jornalística. Errou, como é evidente. Mesmo que a impunidade e os nossos brandos costumes venham a relevar a confusão entre os negócios da política e os assuntos de família que sua excelência, no mínimo, aceitou.
Como é evidente, não acho que a condição de membro da família de quem detém o poder deva funcionar como circunstância condicionadora das escolhas profissionais que os familiares dos políticos queiram fazer. Caso tal coisa acontecesse, estaríamos perante uma imoralidade sem nome. Mas como em tudo há-de haver uma medida de bom senso, considero que ninguém tem o direito de assentar a carreira profissional na boleia do poder que os familiares possam deter, sobretudo se essa carreira passar pelo sector público ou equiparado. Ora, parece evidente que estamos perante um caso assim.
Peço desculpa se estiver a ser injusto. Mas, por muita qualidade profissional que o prof. David Gomes possa ter, alguém acredita que o Marítimo se lembraria dele se porventura não constasse do currículo que apresenta a qualidade distintiva de genro do presidente do governo? Sinceramente, presumo que não. E será que alguém duvida de que a ideia de convidá-lo para um lugar na equipa técnica do CSM só ganhou peso e foi concretizada por ser portadora da vantagem de atar o presidente do governo, pelo lado dos afectos, à política de gestão e de contratações da SAD do Marítimo? Com franqueza, julgo que também não. De maneira que a direcção do Marítimo, o prof. David Gomes e o dr. Jardim são objectivamente cúmplices da promiscuidade público-privada que, num dado momento da sua vida profissional, levou o genro do presidente do governo a experimentar a bem remunerada carreira de técnico de futebol.
Dado esse passo, impunha-se porém que todos tivessem a noção das regras da prudência. Não com o objectivo de disfarçar o que já não podia ser disfarçado. Mas sim com o propósito expresso de evitar embaraços futuros. E isso seria o mínimo que se lhes poderia exigir. Mas como mandaram a prudência às malvas, as más notícias começaram a chegar. E um dia destes acabarão todos por perceber que não é boa ideia misturar os negócios da política, e a política dos negócios, com os laços da família.
Certo. A condição de arguido num processo de presumível evasão fiscal e branqueamento de capitais não tem qualquer valor de condenação. A verdade, porém, é que o estigma está lá. E ainda que o dr. Jardim possa ser um mero sujeito passivo desta história, já vai sendo tempo de começar a acordar para a vida. Mas isso, claro, é lá com ele. Cada um deve comportar-se de acordo com os ditames da consciência que tiver. Não deve é esquecer-se que há sempre um preço a pagar pelas opções que se tomam. Sobretudo quando se está na política.
Bernardino da Purificação

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