segunda-feira, 14 de julho de 2008

O tutor da autonomia

Com o dr. Jardim convertido à bondade do estatuto do representante da República, a oposição política regional teria, se fosse ousada, a possibilidade de ultrapassar no PSD pelo lado da Autonomia. Como não é, o dr. Jardim pode bem dizer-se e contradizer-se ao rufo das suas conveniências. E pode até, sem sobressaltos de maior, defender hoje uma coisa e amanhã o seu contrário. O facto traduz a substância da nossa política doméstica. De um lado está um PSD cansado e errático. Do outro está coisa nenhuma.
Eu sei que, num contexto de crise, a controvérsia em torno do representante não aquece nem arrefece. Compreensivelmente, as pessoas dão mais atenção ao salário que encolhe do que às discussões bizantinas acerca de um cavalheiro com vocação para tutor da autonomia. Mas há uma dimensão na política a que os políticos não podem andar alheios. Refiro-me à que trata das questões institucionais, a qual, tal como as outras, requer tempo, exige estudo, reclama reflexão.
Infelizmente, e retomando uma ideia que já deixei expressa em textos anteriores, na Madeira reflecte-se pouco sobre os temas dessa outra dimensão da política. A universidade não está para aí virada nem tem massa crítica suficiente para estimular tal debate. A Fundação Social-Democrata não passa de uma bem sucedida empresa de gestão de imóveis completamente indiferente às questões ideológicas. Os movimentos e fóruns de cidadãos que a certa altura surgiram repousam algures no papel de uma qualquer conservatória. E os partidos preocupam-se mais com as suas tricas diárias do que com as chamadas questões de regime.
Perante tal quadro, registo o esforço que faz episodicamente o articulista Filipe Malheiro. No mais das vezes, discordo do que diz. Não deixo, no entanto, de reconhecer que é dos poucos a dar-se à maçada de problematizar as questões políticas à luz do foco ideológico. Hoje foi isso que fez no JM. Ainda por cima com o desassombro de assumir uma discordância política, ideológica e estratégica com o líder do seu partido a propósito do estatuto do representante da República. Tiro-lhe o chapéu por isso.
É evidente que a questão das competências do ex-ministro da República ocupa uma posição central na discussão sobre a evolução da autonomia constitucional. Quem leu ficou a saber que Filipe Malheiro continua a defender encarniçadamente a extinção do cargo. Porém, parece-me pecar por quase restringir o problema a uma questão de acinte meramente simbólica. Ora, em meu entender ele é muito mais do que isso.
Vejamos sucintamente. Ao cargo de ex-ministro foram conferidas algumas quase competências administrativas bem como outras de natureza jurídica e política. As primeiras eram residuais e de todo inócuas. As restantes tinham uma assinalável substância. No entanto, os doutrinadores do PSD-Madeira andaram a cantar vitória quando se entendeu deixar cair as únicas que, dada a irrelevância substantiva que tinham, em nada colidiam com os poderes autonómicos. Na sua pressa de inventar a aparência de uma vitória, esqueceram-se de dizer, por exemplo, que o ministro transformado em representante da República tem a capacidade de interferir na formação do Direito regional por via de um poder de veto cujo fundamento não se detém em meras razões de controlo da legalidade, mas que, ao contrário, pode alargar-se ao terreno das considerações e do puro juízo político. Ora, é isto que me parece intolerável. É por isso que lamento que na Madeira se substitua a procura de um corpo doutrinário pensado e sistematizado sobre a evolução da Autonomia pelo tacticismo trauliteiro que é usado quando convém.
Bernardino da Purificação

2 comentários:

Anônimo disse...

"Tacticismo trauliteiro" será uma expressão de riqueza semantica e simultaneamente de bondade politica, pouco ou nada representativa da realidade regional.
Será que já se esqueceram do miserabilismo a que chegaram as relação entre AJJ e o MR ?
Extraordinariamente, hà pouco tempo a esta data as então relações, inverteram ou evoluiram 180 graus
(coincide com o aparecimento publico das respectivas Madames, na esplanada do "Apolo" em amenas cavaqueiras refrescadas inclusivamente com rodadas de "Martini" ).
Agora pelo que se vê, depois do MR passar a RR, o AJJ faz questão de o chamr de MR.
Isto é realmente a politica regional no seu melhor.
Entretanto atrevo-me hoje a questionar se este novo idilio politico/amoroso, vai manter-se após a actual recusa de Sua Excelencia à Lei Tabagica Regional ?
Será que voltaremos ao principio, altura em que nunca havia disponibilidade de ambos, em se encontrarem em eventos publicos ?
Advinhar o futuro com esta enigmatica gente, é seguramente tarefa dificil ou impossivel, mesmo para os Bambos e demais advinhos que por aí proliferam.

Anônimo disse...

Crise? Qual Crise?
Vejamos o que os dados oficiais dizem sobre a situação na Madeira:

- perdeu 500 milhões em fundos da UE;

- metade das explorações agrícolas desapareceram;

- o volume de pescado diminuiu e a região é a 2.ª com menos pescadores;

- a contrução diminui à média de 12,3% ao ano;

- o número de falências aumentou 40%;

- a taxa de desemprego atinge os 6,8%, o nível mais alto desde há 30 anos;

- cerca de 22% da população, 22 mil madeirenses, estão na pobreza;

- a divída pública regional é já 600 Milhões. Isto é 75% do PIB empolado, ou 95% do PIB real depois de descontado os 21% que se referem à Zona Franca;

- em 2000 os impostos pesavam 56% nas receitas, em 2006 o peso dos impostos para os madeirenses era já de 65% e a aumentar;

- IRS e IRC são cerca de 17% mais elevados do que nos Açores;

- os produtos de 1.ª necessidade são mais caros devido ao modelo de gestão dos portos;

- a gasolina sem chumbo 95 custa mais 12% do que nos Açores; a gasolina 98 custa mais 13,4%; o gasóleo rodoviário mais 43,5%; o gasóleo agrícola mais 63,3%; o gasóleo para as pescas mais 66,2%;

- o ordenado minímo cresceu apenas 2% enquanto que cresceu 5% nos Açores.

In http://farpasdamadeira.blogspot.com/