Como não sou bruxo nem adivinho, não sei de todo se alguma vez passou pela cabeça do dr. Jardim avançar mesmo para uma candidatura à liderança nacional do PSD. Para lá, obviamente, do esbracejar a que se entregou nos últimos dias, assim do género "agarrem-me, se não vou-me a eles". Como é patente, Jardim foi agarrado. De acordo, julgo eu, com os seus mais íntimos desejos. E nos termos, espero eu, da análise que ele próprio terá feito da situação.
Vamos lá a ver. Se o dr. Jardim quisesse de facto ser candidato, elevaria de tal maneira o limite das condições, ao ponto de exigir a desistência de todos os outros concorrentes? Só quem não conhece o PSD poderia imaginar um cenário semelhante. Ora, Jardim conhece. Porventura, melhor que ninguém. E assim sabe com certeza que a ala cavaquista-mendista-barrosista é como água e azeite relativamente à facção menesista-santanista-populista: podem coexistir no mesmo espaço, mas decididamente não se misturam. De maneira, que o cenário que Jardim colocou como condição para uma sua candidatura só poderia acabar como acabou: com um estampanço no tecto das coisas impossíveis. Porque Manuela Ferreira é muito mais do que ela na candidatura que lançou. E Jardim não o ignora. E porque a suportar a candidatura de Manuela está o sentimento de que é urgente reconduzir o PSD para patamares de respeitabilidade e credibilidade que as últimas lideranças têm posto em causa. E nem mesmo um político como Jardim poderia ignorar este facto. Mas como gosto de pensar que até na política há princípios, espero com franqueza que o pelo menos aparente recuo de Jardim possa ter ficado a dever-se a outros motivos.
Note-se. Jardim antecipou eleições, quase paralisou a vida da Região por causa delas, assegurou que tinha um programa para cumprir, exigiu aos eleitores que plebiscitassem as suas propostas, e agora, um escasso ano volvido sobre a turbulência política que provocou, pura e simplesmente resolvia cavar daqui para fora, ainda por cima deixando no lugar que o povo lhe deu um herdeiro destituído de legitimidade electiva? Não acredito. Ou melhor, não quero acreditar.
Mais. Em oposição ao que foi dito, pode-se sempre argumentar que, se porventura chegasse a ser líder do PSD, nada obrigaria Jardim a abandonar as suas actuais funções na Madeira. Mas então seria política e eticamente aceitável transformar o Governo regional em instrumento da guerra partidária do PSD contra o Governo central? Não acho. E espero sinceramente que Jardim também não.
Mais ainda. Ao longo do último ano, o líder madeirense andou a pedir a Cavaco Silva que interviesse no diferendo que opõe o governo regional a Lisboa, o presidente fez-lhe a vontade, veio à Madeira acompanhado do número dois do governo de Sócrates, fez da visita um panegírico a Jardim e à sua obra, passou deliberadamente ao lado de uma polémica provocada ou pela truculência ou pela imprudência do líder madeirense, e agora, borrifando-se totalmente para o esforçado sacrifício presidencial, resolvia pura e simplesmente ir embora, com a agravante de o poder fazer contra a linha social-democrata tida como herdeira de Cavaco e do cavaquismo? Sinceramente, não acredio. Ou, dizendo melhor, não quero acreditar.
É claro que estas minhas crenças sentir-se-iam muito mais confortáveis se o dr. Jardim não tivesse contribuído para alimentar as especulações sobre uma sua eventual candidatura à liderança nacional do PSD. Mas, como não gosto de fazer processos de intenção, prefiro ficar-me pelo que escrevi no sábado passado neste blogue: Jardim simplesmente gesticula para ver se o vêem e fala alto para ver se o ouvem. Porque sabe que o passado constitui um lastro que, para seu tormento, não conseguirá nunca atirar pela borda fora.
Bernardino da Purificação
2 comentários:
Eu não daria como garantida uma não candidatura pois gerir os silêncios pode ser uma táctica para chamar as atenções sobre sí. Não é só falando e gesticulando que se consegue atingir esse objectivo...
Vou explicar: aqueles que muito provavelmente terão mostrado algum apoio público com a intenção única de o lisongear e "sacar-lhe" os votos aparecerão publicamente nestes dias e de forma fingida a lamentar-se pelo dr. AJJ não se ter candidatado, alguns simulando inclusive desilusão e frustração, difílmente poderão retirar-lhe publicamente o apoio assim que ele de forma surpreendente se candidate. Isto é acção psicológica e ele sabe-a usar...
Postar um comentário