segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

A verdade oculta do anonimato

O senhor presidente do Governo brinda-nos hoje com o favor do seu pensamento sobre um tema cuja importância toca a transcendência. Sua excelência deu-se à maçada de dissertar sobre a candente questão das cartas anónimas. E, para não variar, resolveu emprestar à profundidade das suas reflexões o ar solene dos artigos doutrinários. O veículo escolhido para a divulgação de mais esta pérola do seu legado filosófico-político foi o jornal que mantém cativo da sua soberaníssima vontade. Não se atribua, no entanto, qualquer importância ao facto. O mais certo é que não passe de uma insignificância fortuita de cariz, digamos, circunstancial.
Como sua excelência não explica, não sou capaz de adivinhar nem a dimensão do fenómeno nem o teor do expediente. Mas há coisas que se percebem. A acutilância da escrita impressiona. A oportunidade do tema dá que pensar. O desassombro do verbo é uma seta apontada à nossa consciência colectiva. Aquilo, podem crer, não é um artigo. É um grito. Um estridente sinal de alerta. Que traduz o negrume dos enfados em que se remói a paciência do nosso quinzenal presidente. E nos revela o elevado critério das suas actuais prioridades.
O dr. Jardim entende que as cartas anónimas não passam de um miserável exercício de delação. Nem mais, nem menos. Importa-lhe nada que as cartas possam contar a verdade e nada mais do que a verdade. E interessa-lhe coisa nenhuma que possam ser graves os factos que relatam. Mas não senhor. O anonimato das ditas é que o tira verdadeiramente do sério. Como se fosse assim uma espécie de atestado de maldade inquinando o seu conteúdo pelos séculos adiante.
Não vale a pena, como é evidente, perder muito tempo com a hipocrisia patente das inesperadas sentenças de sua excelência. O que agora tão violentamente condena é precisamente o mesmo que um dia solicitou que fizéssemos. E aquilo que o cavalheiro tem agora como sintoma claro de uma espécie de doença social perigosa e larvar é rigorosamente o mesmo que, não há muito tempo, defendeu como sendo um mais que recomendável exercício de cidadania. Nada a fazer. O dr. Jardim é assim mesmo. As suas conveniências são firmes. Só os princípios são flutuantes.
Nem vale a pena, de igual modo, gastarmos demasiado tempo em conjecturas sobre as eventuais motivações da prosa doutrinária do nosso eterno, embora intermitente, presidente. É avisado, no entanto, que ninguém descarte a hipótese de, no fim de contas, sua excelência estar a lembrar-nos, urbi et orbi, da serventia das cartas anónimas. Compreendam. O homem não só é tortuosamente maquiavélico, como precisa urgentemente de tomar contacto com a realidade. Estamos em vésperas de muitas eleições. Há candidatos ainda por escolher. E esta coisa de passar a vida em excursões quinzenais alguma mossa há-de deixar na qualidade da informação que lhe chega.
Não obstante tudo isso, prefiro levar a sério desta vez as súbitas dores do nosso companheiro de quase todas as horas de quase todos os dias dos últimos trinta e tal anos. Para expressar o entendimento de que o recurso ao anonimato diz muito mais sobre a natureza do regime do que sobre o carácter de quem o adopta. Uma terra que discute mais as intenções putativas de quem escreve do que a substância do que é escrito legitima a utilização da identidade escondida. A perversa punição social de quem reivindica o cívico direito de dizer que o rei vai nu dá força necessariamente ao caminho da clandestinidade. Donde, senhor presidente, o anonimato que um dia incentivou e agora condena não é, como diz, uma coisa de bufos. É, isso sim, um instrumento de defesa. Pior. É uma perversa e triste consequência do regime de que é chefe. E eu sei que tudo isso já lhe foi dito na cara.
Bernardino da Purificação

10 comentários:

Anônimo disse...

Pois é... o Dr. Jardim, se a incoerência pagasse imposto, não precisava do dinheiro "roubado" pelo Sócrates. Ele sózinho equilibrava o orçamento e talvez apresentasse saldo positivo. Lembram-se dele dizer: na RAM todos se conhecem. Quem tiver conhecimento de algum caso de enriquecimento indevido que apresente queixa em Tribunal. Isso foi há anos. Nunca mais lhe ouvimos semelhante racícinio. Qual a mosca que o mordeu para tal esquecimento?
Preocupa-se, agora, com as cartas anónimas e com as acções populares. Vai produzir legislação a responsabilizar quem põe as acções populares. Qual a punição que reserva s.exa. aos eleitos que mandam às malvas as leis que, no acto de posse, juram ir cumprir atropelando-as, porém, à priemira decisão que tomam? Reserva-lhes um louvor?
Qunto a perseguições lata não lhe falta...

Anônimo disse...

O Bruder está agora mesmo a receber, directamente da boca (que nojo!) do João Banana, o comentário para colocar aqui. Afinal o Bruder não é heterónimo: o João Banana é que é ventríloquo.

Bruder disse...

Ó " anónimo" dos 17 de Fevereiro de 2009 15:24, por acaso concordo consigo, em 95% do post.Para não desviar a atenção para o vedetismo que lhe é servido , por estes acólitos da tagarelice, nem comentarei em que estamos de desacordo no 5%.Note como a percentagem está bem medida .. srs.
Compreendo que seria para vossa mercê algo excepcional, se o dito João Banana se dignasse argumentar fosse o que fosse neste espaço.Não se iluda.Isto continua a ser o mais equivalente a uma carta anónima.Já sabe o resultado, não sabe ?

Anônimo disse...

O dr.Jardim continua, e continuará, a nadar neste charco, podre, de ignorância.
Charco que alimenta,é certo,mas que não me desresponsabiliza,nem aos meus compadres,da sua tão longa e fétida existência.
Mea culpa.

Anônimo disse...

Não tenho grande simpatia pelo anonimato, venha donde vier. Mas compreendo que haja situações em que, doutra forma, seria impossível fazer valer certos pontos de vista. Porque todos sabemos que os poderosos nem sempre têm o discernimento suficiente para aceitar críticas, por mais justas que sejam. Isto para não dizer nunca as aceitam.
Por outro lado, quem dá a face e se identifica, nem sempre o fará por razões justas. Muitas vezes fá-lo porque quer agradar a alguém, mostrando a sua inabalável militância...
Porém, neste contexto, não deixa de ser curioso que neste espaço apareça uma comentadora que, sendo ferranhamente partidária do grande timoneiro, resiste à tentação de dizer quem é, para o impressionar e daí tirar vantagem. Preferiu ocultar-se debaixo de um anonimato mal disfarçado.
É fácil de ver que, se não revela a sua identidade, só pode ser por uma razão: já se senta à gamela da "nomenklatura" e não quer que o saibamos.

Anônimo disse...

Lá continua o (a) BRUDER a sua cruzada contra a tagarelice. Os déspotas são todos iguais. Verdades insofismáveis que não sendo as suas ou de quem lhes paga são tagarelice. Os seus racíocinios viciados e insultuosos são verdades cristalinas. BRUDER, tente perceber que 30 anos a fazer a mesma finta "o jogador" só enagana quem quizer deixar-se enganar. Lá está... o acesso à gamela como muito bem refere Fernando Vouga.

Anônimo disse...

Caro Jorge Figueira

Os comentários da senhora em questão, como já disse aqui, fazem falta. E, por isso, temi que, perante os nossos ataques, ela deixasse de comentar. Mas, felizmente e para divertimento de nos todos, ela é como Hugo Chavez: não se cala.
Por outro lado, apesar de ainda não ter rebatido uma só ideia sequer, os seus ecritos são como as flores de um jardim, servem de enfeite.
E a propósito de jardins e flores, veio-me à ideia este ditado popular: uma testa sem hastes é como um jardim sem flores.

amsf disse...

Segundo o "nosso" Vice a Madeira não necessita de qualquer plano anti-crise porque - ao contrário de outros - sabia o que ai vinha e foi tomando as devidas medidas. É pena o Berardo não ter sido avisado, evitava ter perdido c/ de 800 milhões nos últimos 2 anos!

Anônimo disse...

A maior parte das vezes, as cartas anónimas dizem muitas verdades que não estão aos olhos de toda a gente. O sr. presidente do governo manda-as para o lixo? Ele próprio não tem tempo para fazer uma leitura atenta e séria, uma vez que o mesmo passa mais tempo fora da Madeira do que na Quinta Vigia.

Anônimo disse...

Pessoalmente alegra-me que o Sr.Ricardo Viera-Advogado, e o Sr.Ricardo Vieira -Vereador continue fundido num , nos dois estados latentes.Uma espécie de ave rara, ora sendo o que é não,ora sendo o que parece.Se um dia o Vereador que é, acolher e votar um projecto que o Advogado saiba que não deve ser, então o Advogado-Vereador escolherá segundo o momento e conveniências.E a grande questão continua a ser a de sempre, e ainda não esclarecida: as das competências profissionais no exercício das funções políticas. E isto está mais além do simples caso do Dr.Ricardo Vieira, que infelizmente continua a ser o único.
Francisco Nobrega.