Ponto prévio. Considero que a Madeira tem o dever (não apenas o direito) de desenvolver uma política autónoma, estruturada e séria de ligação à diáspora. A força homogeneizadora da globalização recomenda-a. A necessidade de integração das nossas comunidades nos espaços sócio-culturais em que vivem não a dispensa. O pragmatismo prosaico da economia aconselha-a. E os afectos conferem-lhe o imperativo estatuto de uma obrigação. A questão de saber se essa política deve, ou não, ser pensada e desenvolvida em articulação com a que é definida a nível nacional não é neste momento para aqui chamada. Por uma razão simples. É muito mais de método do que de substância. Logo, há-de ter, se for caso disso, um tratamento secundário no contexto das reflexões que possam ser feitas sobre a natureza dos laços que temos o dever de manter com as restantes parcelas constitutivas da nossa identidade e do nosso modo de ser.
Consideração acessória. Qualquer política voltada para a manutenção e aprofundamento dos laços da Madeira com as comunidades disseminadas pelo estrangeiro há-de contemplar, em qualquer circunstância, e entre vários outros aspectos, a concretização de um programa de contactos. Envolvendo, com certeza, representantes do poder político regional. Aproveitando, sempre que possível, a rede de canais (tanto a formal como a informal) de que o país dispõe. E estimulando, obviamente porque sim, a criação mais ou menos institucionalizada de espaços de encontro, partilha e diálogo.
Conclusão lógica. Anda bem um governo que envia os seus membros às comunidades. Andará melhor se for capaz de integrar as deslocações que decide num programa estruturado e com um mínimo de oportunidade e sentido. Andará bastante melhor se a ligação às comunidades não se resumir à concretização mais ou menos excursionista desse programa de viagens.
Está claro que o pretexto da prosa é a aventura australiana do dr. Garcês. Que, por qualquer razão que desconheço, foi preparada mais ou menos à socapa. E que, por razões que apenas a má consciência poderá eventualmente explicar, só ganhou alguma visibilidade por via do estranho secretismo com que um membro do governo desajeitado ou aselha entendeu dever embrulhá-la.
Eu gostava de poder acreditar que o dr. Garcês foi à Austrália no cumprimento de uma agenda política assumida e transparente. E dar-me-ia algum conforto saber que não passava pela cabeça de ninguém ocultar do escrutíneo público os contornos e resultados dessa política. Não custa reconhecer, porém, que o comportamento do dr. Garcês torna difícil a concretização desses meus pios desejos. Porque se esteve nas tintas para o democrático dever de prestar contas. Porque conferiu a uma viagem de orçamento, motivações e objectivos públicos o sigilo a que só têm direito as viagens privadas. E porque ao fazer tudo isso desvalorizou o contacto com uma comunidade que certamente dispensa visitas feitas às escondidas.
Eu sei que os indulgentes dirão que há um excesso de severidade na expressão destes reparos. E em abono da sua complacência hão-de lembrar que o dr. Garcês nada mais faz do que imitar o comportamento do seu chefe. Não deu explicações porque entende não ter satisfações para dar. E nada nos disse sobre a sua viagem à Austrália exactamente como o dr. Jardim nada nos diz sobre as suas idas quinzenais sabe-se lá aonde. Está certo. O dr. Garcês não é o culpado. A culpa, de facto, é de um governo que não tem políticas claras sobre coisa nenhuma (daí a necessidade de esconder o que faz). O culpado é um governo casuísta, de condutas opacas e destituído de estratégia, que se limita a navegar à vista. A culpa é, em suma, desta impune mania com que o governo estatiza tudo menos a conduta dos governantes. Nesse domínio, como já se viu, tudo é do foro privado. Mesmo quando é público o dinheiro gasto. Mesmo que a democracia não dispense a prestação de contas e a apresentação de resultados.
Bernardino da Purificação
5 comentários:
Com a falta de liquidez que há por ai é natural que o Secretário mantivesse segredo sobre a sua missão.É que neste momento anda toda a gente à procura de liquidez, são os Sílvios Santos, os Berardos,etc! Com o nível de endividamento que a Madeira tem já não vai sendo fácil convencer os mesmos!
Caro Bernardino, não desperdice nem prejudique o brilhantismo da sua magnificiente escrita, com comentários a atitudes deste tipo.
O Sr. Secretário quer ir passar um mesito à Australia, e quem somos nós, óh grandes vilões desta terrivel Mamadeira, para sindicarmos os termos e objectivos da referida viagem.
Façamos como nos ensina o Procurador Freitas em diálogo com o Jornalista de - El País - falemos de futebol e do Cristiano Ronaldo...!
E viva o obscurantismo selvático deste miseravel jardinismo.
Porque será que ainda há gente que não percebe a ironia de amsf e outros?
E o Vilhão sou eu?!
Estes indivíduos sabem que a vaca está a secar. O jardinismo, tal como todas as ditaduras e afins, não vai sobreviver ao grande timoneiro. Apesar de a palavra dos políticos valer o que vale, não é muito credível que o actual Presidente do GR se perpetue no poder. Teria que fazer um golpe de rins que decerto lhe partiria a coluna.
Por outro lado, a crise económica, mais tarde ou mais cedo, chegará ao orçamento da Região. Nessa altura não haverá dinheiro nem para mandar cantar um cego, quanto mais para férias pagas na Austrália.
Sendo assim, há que aproveitar ao máximo os últimos cartuchos.
Uma coisa é certa: aquela viagem já ninguém lha tira.
Eu acho que efectivamente o Dr. Garcês, pelo seu apelido facilmente associável a uma Agência Funerária,sente que o "doente" que tem em mãos não é financeiramente recuperável. Resta-lhe aproveitar o último folego antes que desabem as "sociedades de endividamento" por si abençoadas a saídas do bestunto de S. EXa. o Sr. Vice-Presidente. É verdade que é feito da Caixa de Crédito Agrícola?
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