Não custa nem será exagero reconhecer que o ultraperiferias constitui um caso no contexto da blogosfera madeirense. É imensa a quantidade de informação relevante que nos faculta. E, por outro lado, constitui às vezes um verdadeiro barómetro da meteorologia interna do universo laranja.
Não quero cometer a injúria de olhar para ele como quem olha para uma central de propaganda partidária. Não ignoro, é certo, as ligações e responsabilidades políticas do seu autor. Porém, pelo que me tem sido dado ler, não tenho quaisquer dúvidas em creditar-lhe uma saudável autonomia de pensamento e propósitos.
Dito isto, não creio que LFM deva sentir-se incomodado com eventuais leituras políticas que os seus escritos possam suscitar. As coisas são o que são. E um dirigente partidário há-de ser sempre um dirigente partidário. Sobretudo para quem com ele priva na via exclusiva da leitura dos seus escritos.
O cuidado deste intróito radica no facto de gostar pouco de equívocos. Ora, como volta e meia surpreendo umas nem sempre divertidas trocas de mimos entre LFM e outros respeitáveis autores de blogues (só explicáveis à luz da conflitualidade partidária que entre eles se sabe existir), prefiro evitar ver-me envolvido em querelas que ultrapassam a saudável discussão de ideias. Até porque, nesta fase da vida, as ideologias fascinam-me bastante mais do que as organizações partidárias que temos.
Tudo isto, em suma, para constatar que o dirigente partidário LFM não se cansa de, através do seu blogue, nos dar conta da turbulência que se vai instalando no interior do PSD. Há dias vimo-lo lamentar a total falta de coordenação observável ao nível da acção do governo. Agora observamos-lhe as farpas a propósito das divisões internas cada vez mais visíveis nas hostes sociais-democratas madeirenses, que o congresso nacional laranja mais não faz do que amplificar.
Como pessoa educada que parece ser, LFM tem recorrido ao eufemismo. Assim, a mencionada falta de coordenação política da actividade governativa foi por si descrita como não passando de um mero problema de comunicação a que é preciso pôr cobro. E quanto às dissensões internas descortináveis no seu partido, LFM prefere tê-las à conta de uma qualquer sede de protagonismo que terá começado, de repente, a atormentar certas figuras do jet set laranja.
Não cometo a deselegância de pensar que LFM não vê o que está à vista de todos. Ele vê, com certeza. Porventura, muito melhor do que nós, dado o conhecimento privilegiado que tem. De maneira que compreendo que o dirigente partidário, que o incansável autor do ultraperiferias não deixa de ser, reduza a uns quantos eufemismos e a algumas farpas as suas observações a propósito do PSD e do governo. Em boa verdade, não pode fazer outra coisa. A militância e a solidariedade partidária a isso certamente o obrigam. O problema é que o observador autónomo que gosta de ser convive mal com uma realidade a que não estava manifestamente habituado. Que se traduz numa total ausência de coordenação política. Que evidencia uma notória falta de comparência de quem devia liderar o governo e o partido. E que se exprime na forma como cada um vai começando a organizar a vidinha sem pensar, como outrora, em prestar contas ao chefe.
Digo de outro modo. O que LFM seguramente vê mas não pode dizer é que iniciámos já o pós-jardinismo, mesmo que Jardim continue a andar por aí. Compreendo o incómodo: não há nada mais ingrato do que ver um bando de ex-seguidores a fazer-se já ao futuro com o presente ainda vivo. E, se calhar, LFM acredita que os seus eufemismos e farpas podem fazê-los e fazer-nos pensar que o dr. Jardim ainda é capaz de, a qualquer momento, puxar novamente as rédeas à situação e assim acabar com o desnorte (ou será antes com o bem norteado "salve-se quem puder"?) que parece ter vindo para ficar. Cada um, é claro, acredita no que quer. Eu, por mim, não lhe recomendaria tanto optimismo. Até porque os lobos alimentados por e à custa de Jardim cresceram já o suficiente para se considerarem desobrigados da continuada sujeição à sua tutela.
Bernardino da Purificação
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