Um dia destes, por força da nova legislação que entrará brevemente em vigor, o Jornal da Madeira vai ter de mudar de vida. A lei, que entrou já na antecâmara dos diplomas aprovados, é clara: nem o estado, nem as regiões, nem as autarquias podem deter, directa ou indirectamente, quaisquer órgãos escritos de comunicação social. O que parece apontar para a extinção do JM tal como ele actualmente se apresenta.
Tem sido dito que a lei laboriosamente preparada pelo ministro dos assuntos parlamentares teve a intenção de visar directamente o único jornal do sector público existente no país. É capaz de haver algum exagero nessa acusação. Mas lá que parece que terá sido assim, lá isso parece. De maneira que, não tarda nada, lá iremos assistir à eclosão de um novo episódio do confronto político entre a Quinta Vigia e o Terreiro do Paço a pretexto de um jornal que em tempos pertenceu à Diocese.
Como é bom de ver, o cinismo político com que os dois beligerantes costumam alindar as suas disputas vai, com toda a probabilidade, conduzir ao encerramento do jornal em questão. O dr. Jardim e o seu governo aproveitarão para resolver a enorme maçada em que o JM se tornou. Vão seguramente fechá-lo. E, numa manobra de oportunismo político puro e duro (que os cavalheiros exibirão como prova da sua imensa sagacidade e esperteza), hão-de sugerir aos mais de cem trabalhadores do jornal que peçam contas a Sócrates e a Santos Silva pelo desemprego em que poderão vir a cair. Pelo seu lado, o governo central e o PS-M hão-de retorquir dizendo que, tendo o problema sido criado por Jardim, deve ser ele a responder pela inquietação que paira ameaçadoramente sobre cem lares madeirenses.
Isto é, para qualquer dos lados, os efeitos de mais um episódio da sua refrega política não passarão de meros danos colaterais. Mesmo que esses danos se exprimam pelo sacrifício de uma centena de pessoas que não têm a mais leve culpa do beco sem saída para que foram atiradas.
Aqui chegado, sei que os moralistas do fundamentalismo dos fins já estarão a criticar-me por parecer que me afasto do verdadeiro busílis da questão. E em abono da sua crítica avançarão com o argumento simples e definitivo de que o JM é uma questão de higiene democrática que tem de ser rapidamente resolvida.
Reconheço, é claro, a justeza do argumento. Não posso, porém, deixar de fazer notar que a aplicação fria e crua das conclusões de um qualquer exercício de racionalismo democrático pode ocasionar efeitos perversos que, com imaginação e boa vontade, se poderiam evitar.
Ou seja, o que defendo é que, no quadro do diálogo que deveria existir entre o Funchal e Lisboa, fosse procurada uma fórmula gradualista que permitisse à empresa do JM começar por libertar-se da subordinação política a que está sujeita, sem perder com isso a almofada económica de que ainda precisa para assegurar a sua sobrevivência. Tudo, é claro, devidamente calendarizado, contratualizado e democraticamente fiscalizado por forma a que se pudessem evitar eventuais desvios a um processo de efectiva recuperação e viabilização da empresa. Deveria ser esse, do meu ponto de vista, o caminho a seguir. Porque a política deve consistir em encontrar soluções e não apenas em extinguir problemas. A maçada é que, no caminho que se prefigura, em vez de se apontar para uma recuperação possível (e a meu ver, desejável), só se ouvirá falar de uma extinção inevitável. E de pouco me importa que depois alguns se entretenham a discutir culpas. Sem embargo de me parecer que as maiores (porventura, as exclusivas) são de quem, ao longo de todos estes anos, se limitou a considerar o JM e os seus trabalhadores como meros peões de um jogo político qualquer.
Bernardino da Purificação
Um comentário:
Sinceramento não acredito no fecho do JM. O PSD/M há-de arranjar um testa de ferro (privado)que o compre e o mantenha na actual linha editorial nem que para isso a Fundação Social Democrata tenha que arranjar forma de o financiar. Mas se o fecho for inevitável teremos um DN a ser pressionado e "comprado" de forma a divulgar ainda mais a voz do poder. É suposto haver ética jornalistica no entanto é preciso não esquecer que o DN é uma empresa e como empresa viza o lucro! Não me admirava que a igreja aceitasse esse papel de testa de ferro...
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