São curiosos os alinhamentos de alguns dos nomes mais sonantes do PSD-M relativamente às candidaturas à liderança nacional do partido. Ao contrário do que acontecia no passado, parece-me claro que os apoios já tornados públicos são o resultado de estratégias políticas e pessoais assumidas e autónomas.
Explico o que quero dizer. Antigamente, todos os alinhamentos eram convenientemente articulados com o chefe. Se um dos miguéis apoiava um dos candidatos em presença, o mais certo é que o outro havia de fazer parte das listas de uma outra candidatura concorrente. E se Jardim resolvia permitir que algum dos candidatos jogasse com o seu nome, significava que, entretanto, já tinha negociado a inclusão de uma figura regional da sua inteira confiança na lista candidata ao conselho nacional de qualquer outra sensibilidade presente da disputa dos votos. De maneira que o líder social-democrata madeirense conseguia jogar em todos os tabuleiros, assim como quem joga numa tripla de totobola - mais coisa, menos coisa, a coisa dava sempre certo.
Bons tempos, esses, para o dr. Jardim. Eram os tempos da gloriosa unidade estratégica: todos ao serviço do partido; e todo o partido ao serviço de Jardim (as reservas mentais mais ou menos conhecidas só circulavam em surdina).
Só que, como atrás do tempo, tempo vem, as coisas começaram a mudar substancialmente. De tal modo que, onde antes havia uma única estratégia (a do chefe e mais nenhuma), passou a haver uma pluralidade delas. E onde antes só se via gente obrigada e agradecida ao líder (apesar de todas as reservas citadas) começou de repente a ver-se um grupo de dirigentes com pensamento próprio e autonomia de objectivos. É por isso que Jaime Ramos e Miguel Albuquerque não tiveram quaisquer dúvidas em declarar o seu apoio a Pedro Passos Coelho. E há-de ser por isso também que Miguel de Sousa não terá hesitado um segundo sequer antes de aceitar ser mandatário regional da candidatura de Manuela Ferreira Leite. Estão todos a fazer pela vida. E é assim que as coisas actualmente são.
Posso estar redondamente enganado, como é evidente. Mas no quadro de umas eleições directas não acredito que os apoios atrás referidos tenham sido previamente cozinhados com o chefe. É que depois dos votos contados, ninguém vai resistir à tentação de analisar os que se verificarem na Madeira segundo uma perspectiva eminentemente regional. Como se de uma espécie de barómetro se tratassem.
Nessa medida, merece uma referência particular a ousadia de todos os que, sem ambiguidades nem subterfúgios, anunciaram a aposta que fizeram. Sendo que, nestas circunstâncias, me parece justo salientar a aposta de risco feita por Miguel de Sousa. De todos os putativos delfins, foi ele quem mais arriscou - aceitou ser mandatário de uma das várias candidaturas. Se Manuela Ferreira Leite ganhar na Madeira, Miguel de Sousa ganha com ela. Se, porventura, a ex-ministra vier a perder, Sousa é o único a acompanhá-la na derrota. O facto de Jardim apoiar Santana constitui, como é óbvio, um dado importante destas contas. Quanto mais não seja pelo facto de o seu apoio conferir à candidatura do ex-primeiro-ministro o estatuto de única aposta política isenta de risco.
Mas como as omissões também são portadoras de sentido, não posso deixar de salientar o sepulcral silêncio de João Cunha e Silva. Como todos os políticos sonsos, anda fechado em copas. Pudera: ele acha que em política só não ganha quem perde. Está enganado, pois então. Como um dia acabará por descobrir. Porque a única coisa mais ou menos irremediável em política é a tibieza das faltas de comparência. E nem lhe valerá de circunstância atenuante o facto de dever andar ainda à procura de saber em que raio de século nasceu, afinal, o Luís Vaz, tão ignaramente por ele referido no espaço que tem alugado na revista no DN.
Bernardino da Purificação
Post scriptum
Os números são brutalmente impressivos. Há dois milhões de pessoas a viver abaixo do limiar de pobreza em Portugal. Uma reportagem divulgada ontem pela TVI ilustrou bem uma situação a que ninguém pode ficar indiferente. Seria importante que a nossa TV pudesse fazer qualquer coisa semelhante, já que as entidades públicas regionais preferem mistificar o problema. Mas isso deve ser pedir muito.
Um comentário:
Esta suposta autonomia dos vários líderes regionais em relação aos apoios aos vários candidatos, seja concertada ou não serve à estratégia do AJJ. É do interesse deste que o PSD tenha um líder fraco e eleito por uma percentagem mínima. Este interesse prendesse com uma hipotética sua candidatura à liderança do PSD ainda antes das legislativas. Um líder fraco aumenta as hipóteses de umas directas antecipadas mas também aumenta as hipóteses de o Sócrates mais facilmente conseguir uma maioria absoluta e não vir a precisar de "comprar" os deputados do PSD/M. Este último cenário parece não estar a ser tido em conta pelo "nosso líder". Se este quisesse nesta altura um PSD forte teria instituído informalmente disciplina de voto nesta questão.
Se antes o desemprego significava pobreza hoje até os empregos/trabalhos a tempo inteiro não são garantia de fuga a essa situação. Os recursos humanos quaisquer que sejam as qualificações são excedentários neste ciclo económico e só têm valor enquanto consumidores no entanto sem rendimentos não pode haver consumo. O espaço vital é insuficiente pelo que a história resolve estes problemas através da guerra, fome ou hipedemias ou sendo mais optimista através de uma revolução científica/tecnológica.
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